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O ENEM 2010 E AS ESCOLAS DO BRASIL


É diferente uma escola em um bairro nobre, com um investimento anual dez vezes superior ao de uma escola pública, em área rural, que atende filhos de lavradores que não tiveram acesso à educação. Situação diferente é a de estabelecimentos com perfis semelhantes em termos de localização, financiamento e alunado, mas rendimento escolar discrepante. Nesses casos, segundo Haddad, o gestor precisa tomar providências para melhorar a escola com fraco desempenho e replicar experiências de sucesso. Quando tem a mesma clientela e desempenho desigual, aí cabe ao gestor público agir (Fernando Haddad, Ministro da Educação do Brasil).

AS NOTÍCIAS

Às vésperas de uma nova edição do Exame Nacional do Ensino Médio – Enem, sai o resultado da edição do ano de 2010, trazendo as médias obtidas pelas escolas participantes. Desta vez, a novidade é que as escolas foram divididas em quatro grupos, de acordo com o percentual de alunos concluintes do ensino médio que participaram do Enem. O Grupo 1 é aquele cuja taxa de participação é igual ou superior a 75%. O Grupo 2 reúne as escolas cuja participação está entre 50% e 75%. Do Grupo 3 fazem parte as escolas que apresentaram taxa de participação entre 25% e 50%. No Grupo 4 estão as escolas com taxa de participação inferior a 25%.

E as manchetes dos jornais e revistas já levam os leitores a concluírem que, mais uma vez, os resultados não foram bons. No Espírito Santo, o jornal "A Gazeta" do dia 12 de setembro trouxe: "Em queda. Em geral, as notas do Exame foram menores em 2010". E a notícia:

A pontuação das escolas capixabas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) em 2010 caiu em relação ao ano anterior. Enquanto em 2009, a escola melhor colocada obteve uma média de 703,67 pontos, ocupando a 48ª posição no ranking nacional, em 2010, o Colégio Leonardo da Vinci – primeiro colocado – ficou com média 690,64, na 102ª posição (GIACOMIN, , 2011, p.3).

Na página seguinte, a informação de que o primeiro colocado no ranking nacional, o Colégio São Bento do Rio de Janeiro, obteve 761,7 pontos de média. 71,06 pontos acima do primeiro colocado no Espírito Santo.

No dia 13 de setembro, mais uma vez, o resultado do Enem é destaque do dia no jornal "A Gazeta": "Escolas públicas. 92% abaixo da média". E a notícia não é nada animadora:

Cerca de 92% das escolas públicas do Estado não alcançaram a nota média das provas objetivas do Enem 2010. (...) A média, segundo o governo federal, é de 511,21 pontos (THOMPSON, 2011, p. 3).

Assim, no resultado do Enem, apenas 20 das 276 escolas públicas participantes fizeram mais pontos do que a média nacional. Entre as escolas particulares, das 102 participantes, quatro não alcançaram a média.

Ainda nesta edição do jornal "A Gazeta", a opinião de Roberto Garcia Simões, sob o título "ES leva pau no Enem" pinçando detalhes dos resultados do Espírito Santo no Enem:

Tomando-se os devidos cuidados com interpretações do Enem, deve-se registrar, mais uma vez, o desempenho horroroso do Estado no Brasil- tanto no topo quanto no piso das médias de alunos por escola, em 2010 (SIMÕES, 2011, p. 17).

E entre os detalhes, é chamada a atenção para o fato de que o Espírito Santo não tem nenhuma escola, nem pública, nem particular, entre as 100 com as melhores médias do País. Entre as 100 piores médias das escolas públicas com mais de 75% de participação dos alunos, no entanto, o Espírito Santo aparece com 31 escolas com as menores médias, sendo seguido pelo estado do Ceará, com 16 escolas, Maranhão, com 11, e Santa Catarina com uma. Outro detalhe é que a segunda pior média nacional, é da EEEFM José R. Christo, situada na zona rural de Afonso Cláudio que, ficou na frente apenas da Escola Estadual Índígena Txeru Ba' e Kua, localizada no município de Betioga, em São Paulo

E em todas as reportagens, nessas e nas dos dias seguintes, é destacada a diferença entre o desempenho das escolas públicas e particulares.

Mas a perplexidade, apesar de serem resultados que se repetem a cada ano, não se restringe ao Espírito Santo. A revista Veja de 21 de setembro deu destaque ao resultado do Enem, começando por focalizá-lo já na Carta ao Leitor, intitulada "O descalabro do ensino". E traz:

A tabulação das provas do Enem feitas por 3,2 milhões de estudantes brasileiros traduz em números uma realidade que, de tão perversa, exigiria que de uma vez por todas a educação de qualidade fosse colocada como a grande prioridade nacional: apenas 6% das escolas – 1.500 de um total de 23.900 que participaram do exame – poderiam ser listadas como instituições de ensino que formam alunos preparados para os imensos desafios propostos pela economia global e digital do século XXI. É muito pouco. É quase nada. É um desastre. Urge mobilizar as energias do país para começar a reverter esse trágico descalabro.

Na mesma edição da revista, a reportagem "É preciso preencher a cabeça deles", em que são mostrados os números alcançados pelas escolas brasileiras no exame e feita uma comparação entre alguns aspectos da educação no Brasil e em países da OCDE- Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, com ênfase na formação dos professores e no tempo dos alunos em sala de aula. Segundo a reportagem, enquanto no Brasil os cursos de pedagogia destinam apenas 20% do tempo à prática escolar e muitos professores, cerca de 4000, nunca sequer pisaram em uma universidade, os cursos em países da OCDE são voltados para a prática e as pessoas sem a formação adequada não podem pleitear emprego como professor. Enquanto no Brasil o tempo dos alunos em sala de aula é, geralmente, de 4 horas diárias, nos países da OCDE, o número de horas diárias é de 6 horas, chegando a 8 horas em países como a Coréia do Sul e Finlândia. Cita, ainda, uma pesquisa que acompanhou o dia a dia de dezoito escolas públicas durante quase um ano e que chegou à conclusão de que "mesmo entre as melhores, o tempo líquido em sala de aula não passava de duas horas e treze minutos, contados no relógio" (BETTI et all, 2011, p. 93).

Ainda nessa edição, a revista traz o ensaio do economista Cláudio de Moura Castro sob o título "Ensino médio com sabor de jabuticaba", em que o foco é no currículo único do ensino médio brasileiro em contraposição aos de outros países e no "inchaço" do currículo, com excesso de disciplinas obrigatórias.

(...) como se pode ver nos livros, há assuntos demais, dentro de cada disciplina, como se todos fossem gênios e tempo das aulas fosse o dobro. Como nos diz a teoria cognitiva – e Whitehead, lá nos idos de 1917 -, o que quer que se ensine tem de ser em profundidade. Com a inundação dos conteúdos, nada se aprende, mas de tudo se ouve falar. Sabemos que só se aprende quando se aplica, mas falta tempo para lidar com exemplos, projetos e pesquisas. Sem isso, nada feito. Soma-se ao desastre uma jornada escolar excessivamente curta, além das greves e do mau uso do tempo (CASTRO, 2011, p. 98).

E cita o que ele chamou de "uma dieta mínima", impopular, segundo ele, para melhorar essa situação:

1- limitar dramaticamente as disciplinas obrigatórias, com português, matemática e pouco mais;

2- redefinir as ementas, de forma que as exigências sejam explícitas e estejam ao alcance do aluno real;

3- variar os níveis de exigência, de acordo com o perfil do aluno;

4- diversificar, para atender às preferências dos alunos, pela oferta de "sabores" diferentes (humanidades, ciências naturais, biológicas, etc.);

5- enfatizar a aplicação das teorias em projetos e exercícios práticos (impossível com o dilúvio curricular de hoje);

6- simplificar o acesso e mesmo encorajar excelentes profissionais sem licenciatura a ensinar matérias afins à sua área (engenheiros, médicos, advogados, farmacêuticos etc.);

7- aumentar a jornada escolar em pelo menos uma hora, para todos os alunos da escola, não apenas para um grupelho (CASTRO, 2011, p. 98).

OS RESULTADOS: PÚBLICAS X PRIVADAS

Considerando-se apenas as escolas com mais de 75% de participação, entre as cem melhores pontuações, aparecem 87 escolas privadas e 13 escolas públicas, entre elas nenhuma de rede estadual ou municipal. As escolas públicas que se destacaram são colégios de aplicação de universidades, colégios militares, escolas federais e escolas técnicas. E, entre as cem piores, apenas uma escola privada: o Colégio Espaço Fera, do estado de Pernambuco, que obteve 480,56 pontos, ocupando a 4.141ª posição.

Entre as mil escolas, com participação superior a 75%, que obtiveram as maiores pontuações, 926 são privadas e 74 são públicas, enquanto entre as mil que obtiveram as menores pontuações, 289 são privadas e 711 são públicas.

Responsáveis por 88% das matrículas do ensino médio do país, as escolas públicas são maioria entre as que ficaram com nota abaixo da média nacional no Enem 2010 (511,21 pontos), representando 96,0% do total.

É importante, também, que analisemos os resultados obtidos pelas escolas públicas e privadas no Enem 2010 em cada uma das áreas avaliadas.

Tabela 1: Médias por prova no Enem 2010, entre as escolas com mais de 75% de participação.

Disciplinas

Média no País

Média nas escolas privadas

Média nas escolas públicas

Diferença entre as médias/percentual de diferença entre as escolas privadas e públicas

Matemática e suas tecnologias

576,87

600,21

509,67

90,54 /17,7%

Ciências humanas e suas tecnologias

585,49

602,57

536,29

66,28 /12,3%

Linguagens, códigos e suas tecnologias

552,84

569,66

504,41

65,25 / 12,9%

Ciências da natureza e suas tecnologias

532,87

548,78

487,06

61,72 / 12,6%

Redação

636,56

651,37

593,81

57,56 / 9,7%

Fonte: Blog do Alderi, 16 set. 2011.

Essa discrepância entre os resultados das escolas públicas e escolas privadas é vista pelo ministro da Educação, Fernando Haddad, como "intolerável". Mas, para ele,

Às vezes, as condições socioeconômicas das famílias explicam muito mais o resultado de uma escola do que o trabalho do professor e do diretor. E, muitas vezes, as escolas são sobrecarregadas com responsabilidades que não são delas. É muito diferente uma escola de um bairro nobre de uma região metropolitana de classe média, cujo investimento por aluno é dez vezes o investimento por aluno da rede pública, de uma escola rural que atende a filhos de lavradores que não tiveram acesso à alfabetização.

Para Mozart Neves Ramos, membro do Conselho Nacional de Educação (CNE) e do Conselho de Governança do movimento Todos Pela Educação, a ausência de escolas públicas entre as melhores do Enem não é novidade e deriva da desigualdade de acesso a oportunidades educacionais no país. Para ele,

Esse quadro é um reflexo do próprio apartheid [regime de segregação racial na África do Sul], causado por uma educação que não é oferecida no mesmo patamar a todos desde a alfabetização. As avaliações mostram que essa desigualdade [da qualidade do ensino oferecido por públicas e particulares] começa lá atrás e vai se acentuando ao longo do percurso escolar. O jovem da escola particular chega ao nível de formação e aprendizado esperados quando termina o ensino médio, mas o da escola pública chega com três ou quatro anos de déficit na aprendizagem. A luta é desigual.

Os dois especialistas, assim como muitos outros, apontam para as diferenças existentes entre as condições sócio-econômicas dos alunos das escolas públicas e das escolas privadas como a causa do fosso que separa o desempenho dos estudantes de cada esfera administrativa. No entanto, em um estudo recente publicado no blog Damarlu Educação (www.damarlueducar.blogspot.com), verificamos que as consequências da incidência da pobreza não se dão de forma linear, isto é, nem sempre existe uma correlação entre o nível da pobreza e o desempenho do sistema de ensino.

O estudo tomou como referência os resultados do Censo Escolar 2010. Nele foram analisados rendimentos dos sistemas de ensino como distorção idade-série, reprovação e abandono escolar, relacionando-os com a incidência da pobreza, levando em consideração os dados do Mapa da Pobreza e Desigualdade 2003, elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

No caso da distorção idade-série, realmente as regiões Norte e Nordeste, com maior incidência da pobreza, apresentaram os maiores índices de distorção idade-série, apesar de ter ocorrido uma inversão entre as regiões: a região Norte, com menor incidência da pobreza, apresentou índices mais preocupantes que a região Nordeste. Além disso, entre os estados da região Nordeste, a Bahia, estado com menor incidência da pobreza, apresentou o maior índice de distorção idade-série, no ensino fundamental, seguido pelo estado do Sergipe, segundo com menor índice de pobreza. O estado do Ceará, o 5º estado menor incidência da pobreza da região, foi o que apresentou o menor índice de distorção idade-série.

No ensino médio, o Piauí, o 4º estado com maior incidência da pobreza, apresentou o maior índice de distorção idade-série, seguido pelos estados da Bahia e Sergipe, 1º e 2º estados com menor incidência da pobreza da região.

Na região Norte, Rondônia, o estado com menor incidência da pobreza, apresentou o 3º melhor índice na distorção idade-série, no ensino fundamental, seguido pelos estados do Tocantins, 4º estado com menor incidência da pobreza e Roraima, 2º estado com menor incidência da pobreza.

No ensino médio, os três estados continuam a encabeçar os melhores índices: Roraima em 1º lugar, seguido por Rondônia e Tocantins. Na região Norte, portanto, a hipótese de que quanto maior a pobreza, piores são os resultados parece se confirmar.

Entre as regiões com menor incidência da pobreza, também, ocorre uma inversão nos índices de distorção idade-série: a ordem crescente da incidência da pobreza é Sudeste, Centro-Oeste e Sul, enquanto a ordem, também crescente, em que se dá o índice distorção idade-série é Sudeste, Sul e Centro-Oeste. Isto é, a região com maior incidência da pobreza é a que apresenta o menor índice de distorção idade-série.

Na região Sudeste, analisando-a isoladamente, tanto no ensino fundamental como no médio, quanto maior a incidência da pobreza, maior, também a distorção idade-série, chamando a atenção os índices dos estados de Minas Gerais e São Paulo, que, apesar de apresentarem a mesma incidência da pobreza, apresentam índices bastante diferenciados de distorção idade-série: no ensino fundamental, o estado de Minas Gerais apresenta índice de 19,3% e São Paulo de 8,4%; no ensino médio, Minas Gerais apresentou índice de 31,3% e São Paulo de 18,1%.

Na região Sul, o estado do Rio Grande do Sul apresentando a menor incidência da pobreza, apresenta os maiores índices de distorção idade-série, tanto no ensino fundamental, como no ensino médio. No ensino fundamental, o Paraná, com maior incidência da pobreza, é o estado que apresenta a menor distorção idade-série.

Na região Centro-Oeste, tanto no ensino fundamental como no médio, o Distrito Federal, com maior incidência da pobreza, apresenta os menores índices de distorção idade-série. Goiás, estado com a menor incidência da pobreza, em ambos os casos, apresenta o 3º maior índice de distorção idade-série.

No caso da reprovação no ensino fundamental, as regiões com maior incidência da pobreza também apresentam os maiores percentuais de alunos reprovados e a ordem dos rendimentos das regiões coincide com o da incidência da pobreza: a região Nordeste apresenta percentual mais elevado de alunos reprovados que a região Norte. Já no caso das regiões com menor incidência da pobreza, os rendimentos se invertem: a região Sudeste, com maior incidência da pobreza, apresenta o melhor rendimento, seguido pela região Centro-Oeste. A região Sul, com a menor incidência da pobreza, apresenta o pior rendimento.

No ensino médio, as regiões Norte e Nordeste apresentam rendimentos superiores aos das demais regiões, com a região Nordeste apresentando, ainda, melhor rendimento do que a região Norte. Entre as demais regiões, a região Sudeste continua a apresentar o melhor rendimento, apesar de ser ela a região com maior incidência da pobreza. Ela é seguida pela região Sul, apresentando, a região Centro-Oeste, o maior percentual de alunos reprovados entre todas as regiões do país.

Entre os estados da região Nordeste, tanto no ensino fundamental como no ensino médio, os estados com menor incidência da pobreza, Bahia e Sergipe, são os que apresentam os piores rendimentos. O Rio Grande do Norte, um dos três estados com menor incidência da pobreza, apresenta o 3º pior percentual de reprovação no ensino fundamental. O Ceará, Maranhão e Pernambuco, 5º, 3º e 6º estados com maior incidência da pobreza na região apresentam os três melhores rendimentos.

No ensino médio, o Rio Grande do Norte, um dos três estados com menor incidência da pobreza, apresenta o melhor rendimento, seguido pelo Ceará e Pará, esse último o 2º estado com maior incidência da pobreza na região.

Entre os estados da região Norte, no ensino fundamental, Rondônia, o estado com menor incidência da pobreza, apresentou o maior percentual de alunos reprovados. O Acre, por sua vez, em terceiro lugar em incidência da pobreza, apresentou o melhor resultado da região.

No ensino médio, o Amazonas, estado com a maior incidência da pobreza da região, apresentou o melhor rendimento, enquanto Roraima, o segundo estado com menor incidência da pobreza, apresentou o pior rendimento.

Entre os estados da região Sudeste, quanto maior a incidência da pobreza, maior o índice de reprovação de alunos, tanto no ensino fundamental como no ensino médio.

Na região Centro-Oeste, no ensino fundamental, o estado do Mato Grosso, segundo em incidência da pobreza, apresentou o melhor resultado. O Mato Grosso do Sul, segundo estado com menor incidência da pobreza, foi o que apresentou o maior percentual de alunos reprovados.

No ensino médio, só ocorreu inversão entre os estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul: o primeiro, com maior incidência da pobreza, apresentou rendimento superior ao do segundo.

Na região Sul, o Rio Grande do Sul, estado com menor incidência da pobreza, apresentou, tanto no ensino fundamental como no médio, maior percentual de alunos reprovados. O melhor rendimento ficou com o estado de Santa Catarina.

No caso do abandono escolar, as regiões com maior incidência da pobreza apresentaram os piores resultados, havendo inversão apenas entre as regiões Sudeste e Sul, com a primeira apresentando rendimentos superiores ao da segunda, em ambas as etapas da educação básica e, no ensino médio, entre as regiões Norte e Nordeste.

Entre os estados da região Nordeste, no ensino fundamental, enquanto os estados do Ceará e Maranhão, 5º e 3º em incidência da pobreza, apresentaram os melhores índices da região, os estados do Sergipe, Bahia e Rio Grande do Norte, estados com as menores incidências da pobreza na região, apresentaram os três piores rendimentos, nessa ordem.

No ensino médio, os estados da Bahia e Sergipe continuam a apresentar os piores resultados da região. Já o Rio Grande do Norte apresentou o melhor rendimento, seguido pelo Ceará.

Na região Norte, no ensino fundamental, os estados com maior incidência da pobreza, Pará e Amazonas, apresentaram os maiores percentuais de abandono escolar. Os estados do Tocantins, 4º em incidência da pobreza, e Roraima, segundo estado com menor incidência da pobreza, apresentaram os melhores rendimentos.

No ensino médio, o estado do Pará apresenta o pior resultado, antecedido pelo Amapá, estado que está entre os três com menor incidência da pobreza. Os melhores resultados foram, mais uma vez, apresentados pelos estados de Roraima e Tocantins, nessa ordem.

Chama a atenção o fato de que, Rondônia, o estado com menor incidência da pobreza da região, apresente o 4º pior resultado, atrás do estado do Acre, no ensino fundamental, 3º em incidência da pobreza, e do Amazonas, estado com maior incidência da pobreza, no ensino médio.

Na região Sudeste, o estado de São Paulo, com menor incidência da pobreza, apresentou o melhor rendimento tanto no ensino fundamental como no médio, enquanto o Rio de Janeiro, estado com maior incidência da pobreza, apresentou o pior rendimento. Os outros dois estados alternaram os seus rendimentos: no ensino fundamental, é o Espírito Santo que apresenta o melhor resultado e, no ensino médio, o melhor resultado foi o do estado de Minas Gerais.

Na região Sul, o estado do Paraná, com maior incidência da pobreza, apresentou também o pior percentual de abandono escolar, no ensino fundamental e o melhor no ensino médio. O Rio Grande do Sul, por sua vez, estado com menor incidência da pobreza, apresentou, no ensino fundamental, rendimento menor que o de Santa Catarina. No ensino médio, foi ele a apresentar o pior rendimento.

Entre os estados da região Centro-Oeste, os dois estados com menor incidência da pobreza, Goiás e Mato Grosso do Sul, nessa ordem, tiveram os piores resultados no ensino fundamental. No ensino médio, continua sendo do estado de Goiás o pior rendimento, enquanto o Distrito Federal, com maior incidência da pobreza, apresenta o melhor rendimento da região.

Analisando, mediante os dados do Censo 2010, o rendimento das escolas privadas, em cada uma das regiões, verificamos que, nem nesse caso, os dados coletados levam a crer que apenas a situação sócio-econômica é capaz de explicar as disparidades registradas na educação do país. Vejamos: a região Sul, região com menor incidência da pobreza, apresentou o melhor rendimento quando analisados os percentuais de reprovação no ensino fundamental e no ensino médio. Por sua vez, a região Centro-Oeste, 2ª região com menor incidência da pobreza, apresentou, nesse aspecto, os piores percentuais nas duas etapas da educação básica.

Ainda: o 2º melhor resultado, tanto no ensino fundamental como no médio, foi apresentado pela região Norte, 2ª também na incidência da pobreza. No ensino fundamental, ela é seguida pelas regiões Sudeste e Nordeste, nessa ordem. No caso do ensino médio, a região Norte é seguida pelas regiões Nordeste e Sudeste, nessa ordem. No ensino médio, portanto, as regiões com maior incidência da pobreza, Nordeste e Norte, apresentaram resultados superiores aos das regiões Sudeste e Centro-Oeste.

No caso do abandono escolar, os resultados do Censo 2010 indicam que as duas regiões com maior incidência da pobreza apresentam resultados piores do que o grupo das regiões com menor incidência da pobreza, tanto no ensino fundamental, como no médio. No ensino fundamental, a ordem só é alterada com relação às regiões Sudeste e Centro-Oeste, com essa última apresentando rendimento inferior ao da primeira. No ensino médio, a região Sudeste apresentou o melhor rendimento, seguida pelas regiões Sul e Centro-Oeste, nessa ordem.

Vemos, assim, que é querer simplificar a análise das causas dos resultados do Enem 2010 e de outros muitos exames que são aplicados visando avaliar o desempenho dos alunos da educação básica, impingir, de imediato, e sem maiores análises, a culpa, pelo mau desempenho das escolas públicas, à situação sócio-econômica dos seus alunos. Existem bons resultados em locais cercados de dificuldades e em escolas sem a mínima infraestrutura. Da mesma forma que existem resultados ruins em escolas e locais cercados, aparentemente, de todas as condições para um bom funcionamento.

No Espírito Santo, o jornal "A Gazeta" do dia 8 de junho de 2011 trouxe a notícia: "Nota 10. Professores do interior dão lição de desempenho". E a notícia:

As escolas do interior do Estado mais uma vez mostraram que, em matéria de qualidade de ensino, dão um banho nas unidades da Região Metropolitana. Os melhores resultados do Índice de Desenvolvimento das Escolas Estaduais (IDE) estão em escola da zona rural, onde, na maioria das vezes, falta o básico, como salas de aula, livros, internet e onde os alunos de várias séries chegam a estudar, juntos, em um mesmo espaço, geralmente improvisado (THOMPSON, 2011, p.5).

Entre as dez primeiras do ranking todas são do interior do Estado e entre as dez piores, são listadas oito escolas da região metropolitana. A pior escola está localizada na região metropolitana, mais especificamente em Cariacica. E a notícia traz que ela, a Escola Dr. José Moysés, que teve IDE de 8,89 (o maior foi de 77,47), está em obras desde o ano de 2008: a escola não conta com biblioteca, laboratórios e os alunos têm aulas de Educação Física em locais improvisados, porque a quadra de esportes está servindo de abrigo para os módulos instalados para servirem de sala de aula.

Por sua vez, mais recentemente, a revista Veja trouxe uma reportagem sob o título "Uma equação vencedora":

Um grupo de professores conseguiu a façanha de formar jovens campeões de matemática em locais cheios de adversidades e com os piores indicadores do país. Eles combinaram esforço com meritocracia (ROMERO; BORGES, 2011, p. 104-108).

Com certeza, esses resultados não dependem apenas do esforço individual dos professores, apesar de ele ser um dos fatores principais. E outros fatores? São necessárias pesquisas que possam levar tais experiências a outros locais. Só não se pode admitir que os responsáveis pela adoção de políticas adequadas ao bom desenvolvimento da educação considerem que, se esses professores conseguiram bons resultados na base do improviso, todos podem conseguir.

Considerando que índices de reprovação e de abandono escolar, assim com os de distorção idade-série são vistos como indicativos do rendimento dos sistemas de ensino, parece-nos estranho que os dados do censo 2010 não sejam coerentes com os resultados obtidos no Programa Internacional de Avaliação de Alunos – Pisa, exame coordenado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE. O exame é aplicado com vistas a melhorar as políticas e resultados educacionais, tendo contado, no ano de 2009, com a participação de 65 países – 34 membros da OCDE e países convidados. Ele é aplicado de forma amostral, segundo critérios definidos pelo Consórcio Internacional contratado pela OCDE para administrar o programa. Caracterizam-se como alunos elegíveis para o PISA todos aqueles na faixa dos 15 anos de idade, matriculados da 7ª série (8º ano) em diante, até o final do Ensino Médio, compreendendo, como estratos principais, as 27 unidades da federação, e como substratos a organização administrativa da escola (pública ou privada), a localização (rural e urbana), incluindo todas as capitais e cidades do interior em cada estado) e o Índice de Desenvolvimento Humano - IDH do estado (cidades com IDH acima ou abaixo da média do estado). O Exame contou, no ano em foco, com a participação de 950 escolas brasileiras e 20.127 alunos. O universo dos participantes abrangeu 470 mil alunos.

Analisemos os seus resultados: entre os 65 países, o Brasil obteve resultados que o colocaram na 53ª posição, atrás de países do Grupo Íbero-americano do Pisa, como o Chile, Espanha, México, Portugal e Uruguai: a média internacional foi 496 e a do Brasil, 401. Em nenhuma das áreas avaliadas, o Brasil obteve média igual ou maior do que a da OCDE. O desempenho das regiões foi dividido em duas partes: regiões com maior incidência da pobreza (Nordeste e Norte) apresentando as piores médias e regiões com menor incidência da pobreza (Sudeste, Centro-Oeste e Sul) apresentando as melhores médias. A exceção com relação aos estados ficou com o estado do Mato Grosso (região Centro-Oeste) que obteve média inferior a de Rondônia (região Norte).

O Distrito Federal, com a maior incidência da pobreza na região Centro-Oeste, apresentou a melhor média do país, mas não alcançou a média internacional: a sua média foi 439. Seguindo-o, na região, temos o Mato Grosso do Sul em 9º lugar, Goiás, em 10º e Mato Grosso em 12º lugar. Na região, a ordem crescente de incidência da pobreza é: Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás.

Na região Sul, o estado de Santa Catarina obteve a melhor média, a 2ª melhor do país, seguido do Rio Grande do Sul com a 3ª maior e o Paraná com a 5ª. Na região, a ordem da incidência da pobreza em ordem crescente é Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Na região Sudeste, Minas Gerais, o estado com menor incidência da pobreza juntamente com São Paulo, obteve a 4ª maior pontuação do país, seguida pelo Espírito Santo - 6ª pontuação -, São Paulo – 7ª pontuação - e Rio de Janeiro, com a 8ª maior pontuação do país. Aqui também não temos discrepâncias entre o resultado do Pisa e a incidência da pobreza.

Na região Nordeste, a melhor pontuação – a 12ª do país - foi alcançada pelo estado da Paraíba, o 2º estado com maior incidência da pobreza do Brasil, seguido pelos estados da Bahia, estado com a menor incidência da pobreza, Pernambuco, Ceará, Piauí, Sergipe, o 2º estado com menor incidência da pobreza, o Rio Grande do Norte, o 3º estado com menor incidência da pobreza, Maranhão e Alagoas, esses últimos, com as menores pontuações do Brasil, também são os estados que têm as maiores incidências da pobreza do país.

Na região Norte, Rondônia, estado com a menor incidência da pobreza, obteve a melhor pontuação da região e a 11ª do país. Segue-o os estados de Tocantins, Amapá, Pará, Roraima, Acre e Amazonas. O Amazonas, estado com a maior incidência da pobreza da região, também foi o que obteve a menor pontuação.

E se analisarmos os resultados das escolas por dependência administrativa, vamos verificar que realmente a discrepância entre as pontuações obtidas e os seus significados em termos de classificação internacional são deveras preocupante. A Tabela 2 apresenta essas pontuações e a posição que seria obtida pela rede de ensino se avaliada isoladamente.

Tabela 2: Médias gerais e pontuação por área, por dependência administrativa no Pisa 2009.

Dependência Administrativa

Média Geral

Posição

Leitura

Posição

Matemática

Posição

Ciências

Posição

Todas

401

53ª

412

52ª

386

52ª

392

50ª

Pública Federal

528

535

521

13ª

528

Privada

502

18ª

516

486

29ª

505

17ª

Pública não Federal

387

60ª

398

58ª

372

52ª

392

50ª

Fonte: Inep/MEC (na definição das posições não foram utilizados critérios de desempate)

Considerando que as médias da OCDE foram: média geral, 496; leitura, 493; matemática, 495 e ciências, 500, verificamos que a rede pública federal obteve pontuação, em leitura, somente inferior a da Finlândia, Coréia e China (Xangai); em ciências, ela estaria apenas atrás dessas e mais, China (Hong Kong), Cingapura, Canadá, Nova Zelândia e Japão. Além desses, em Matemática, a rede federal de ensino, ainda estaria atrás da Holanda, Liechtenstein, Taiwan e Itália. Portanto, a rede pública federal de ensino, em todas as áreas avaliadas, teve médias superiores às médias dos países da OCDE e, se o sistema nacional de educação fosse composto apenas pelo sistema federal de educação, o Brasil teria alcançado a 7ª posição no ranking mundial, à frente de países como o Canadá e Nova Zelândia.

O desempenho das escolas privadas, se avaliado isoladamente, ficaria na 18ª posição com relação aos países participantes. Em leitura, a sua posição seria a 9ª, em matemática, a 29ª e em ciências, a 50ª posição. Como se vê, em matemática, a média obtida é inferior à média da OCDE.

Mas, quando avaliamos o conjunto das escolas públicas de órbitas diferentes da federal, o resultado é lamentável: em leitura, a posição é a 52ª, em matemática, a 48ª, e em ciências, a 45ª. No entanto, como vimos, o Brasil tem no seu sistema de educação, o modelo de sucesso. Por que ele não é implementado?

E o que temos então no Brasil? Exames, exames e exames!... Parece-nos que a cada mês aparecem novos resultados mostrando o fraco desempenho da maioria dos estudantes brasileiros, que são aqueles que estão nas escolas públicas estaduais e municipais. A cada um desses resultados parece que o fosso que separa as escolas públicas, estaduais e municipais, das escolas federais e particulares aumenta mais. E para que servem os exames? Apenas para essa constatação? Para, uma vez mais, impingir às diferenças sócio-econômicas, aos professores, aos pais dos alunos, aos políticos, à própria sociedade, a culpa pelo fracasso? Dessa vez, como vimos, as diferenças sócioeconômicas entre os alunos está levando a culpa, pois o ministro da Educação, Fernando Haddad, apesar de considerar a diferença entre os desempenhos dos alunos da rede pública e da particular como "intolerável", considera, também, "que muitas vezes o baixo desempenho está relacionado não apenas às condições da escola, mas de seu entorno" (ESCOLAS...2011). Isto é, às condições sociais do aluno.

E temos mais: ao opinar sobre a proposta de se afixar em todas as escolas o Ideb-Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – alcançado, a secretaria de educação básica do MEC, Pilar Lacerda, afirmou: "Divulgar o Ideb é necessário. Mas o contexto onde está a escola faz muita diferença nos resultados. Por isso é perigoso uma comparação 'fria' dos resultados"(IOSCHPE, 2011). E assim, a culpa nunca é imputada às condições da escola, aí se incluindo a infraestrutura, o corpo docente, a administração, os materiais pedagógicos disponíveis, etc, etc. Segundo Ioschpe (2011, p.88), "nas escolas ruins, o fracasso é dado como coisa natural ou culpa do 'sistema', dos políticos, dos pais, dos alunos ou da sociedade. Nunca é com elas. A terceirização da responsabilidade, produz indolência".

Ainda, segundo Ioschpe (2011), o secretário da Educação do Rio Grande do Sul, José Clovis de Azevedo, emitiu a sua opinião em evento oficial em que atuou como palestrante, sobre a escola que tem o mais baixo Ideb de uma cidade da Grande Porto Alegre, dizendo que "o importante dessa escola não é o resultado do Ideb, mas o fato de ela ser uma escola inclusiva", pois atende a alunos de áreas de baixa renda. Ora, como inclusão social se a escola não é capaz nem de alfabetizar os seus alunos? O objetivo da escola é só ocupar o tempo do aluno durante algumas horas do dia? Aquilo que ele aprende ou não aprende não é importante? Para o pobre, basta apenas a "inclusão social", segundo o conceito do Secretário?

Se levarmos os posicionamentos da secretária de Educação Básica, do ministro da Educação, do secretário de Educação do Rio Grande do Sul e de muitos outros em consideração, perderemos a oportunidade de investigar situações que fogem da relação "quanto mais pobres, piores os resultados". Como explicar que o Piauí, 5º estado com maior incidência da pobreza, tenha duas de suas escolas entre as 100 melhores notas do Enem, uma delas na 2ª posição, o Instituto Dom Barreto, e a outra na 8ª posição, o Educandário Santa Maria Goretti? Entre as 100 melhores pontuações, ele aparece com 5 escolas, enquanto o estado com menor incidência da pobreza, o Rio Grande do Sul, aparece com 2. Entre as 100 piores pontuações, o estado do Piauí, com 53,11% de incidência da pobreza, aparece com 4 escolas, mesma quantidade do estado de Minas Gerais, que tem 26,60% de incidência da pobreza. E o estado do Espírito Santo que apareceu com 31 escolas entre as 100 piores do Brasil, nenhuma entre as 100 melhores e tem 30,88% de incidência da pobreza?

E as soluções que surgiram após a divulgação desses resultados? O jornal "A Gazeta" do dia 13 de setembro trouxe: "Ministro defende exame obrigatório". E a notícia:

O ministro da Educação, Fernando Haddad, defendeu ontem a possibilidade de tornar o Enem obrigatório no país. "Seria uma atividade obrigatória para a conclusão dos estudos. Não significa que o estudante precisaria atingir uma nota específica, mas a participação", disse (THOMPSON, 2011, p. 3).

Não entendemos! Seria essa uma das estratégias para a melhoria do rendimento dos alunos? Ora, no estado do Espírito Santo o Enem é obrigatório (sic!) desde a edição de 2009, graças a uma Portaria da Secretaria de Educação, e a despeito da não aprovação da medida pelo Conselho Estadual de Educação. No entanto, os resultados não têm melhorado, se era essa a intenção, e, mais ainda: apesar de as escolas públicas terem registrado o maior percentual de participação no país, ele chegou apenas a 67% com mais de 75% de alunos participando.

No mesmo jornal, agora do dia 22 de setembro, outra notícia: "Aluno pode estudar 20
dias a mais por ano". Nela, é informado que o Ministério da Educação (MEC) vai discutir com os secretários estaduais e municipais de educação a proposta de aumento da carga horária anual de aulas. A decisão está fundamentada em pesquisa coordenada por Ricardo Paes de Barros, subsecretário da Secretaria de Assuntos estratégicos da Presidência, que demonstrou que dez dias a mais de aula aumenta em 44% o aprendizado dos alunos e em sete pontos a nota dos estudantes no Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb). E o ministro, segundo a reportagem, afirmou: "Sempre que o MEC se vê diante de uma evidência forte que algo pode melhorar a partir da descoberta de um estudo, temos que perseguir este objetivo". Segundo ele, ainda, "nenhum país com bom desempenho tem uma carga horária de 800 horas (ou 200 dias letivos". Mas vejam o título da notícia publicada no mesmo jornal no dia 5 de maio deste ano, tratando da carga horária de aulas das escolas estaduais do Espírito Santo. Comparem os títulos das duas notícias: "Alunos vão ter 20 minutos a menos de aula a partir de junho". O motivo foi o atendimento às reivindicações dos professores que ameaçavam entrar em greve. Segundo a reportagem, as aulas que até então tinham 60 minutos de duração passarão a ter 55 minutos. Mas os professores ainda não estão satisfeitos: pretendem negociar 50 minutos por aula até o ano que vem.

Mas, o secretário de Educação, Klinger Barbosa Alves, afirmou que o aluno continuará a ter cinco aulas por dia e que a carga horária muda para o professor, e não para o aluno. E mais: afirmou ainda que "os estudantes terão atividades extras obrigatórias, fora do horário regular de aula, para compensar as horas a menos em sala e cumprir as mil horas previstas pelo programa, por ano".

Ora, como que a carga horária muda para o professor e não para o aluno? Serão contratados outros professores para assumir "as atividades extras obrigatórias"? E que "atividades extras obrigatórias" são essas? A carga horária anual continuará a ser de mil horas, segundo o secretário. Mas, e o conteúdo a ser ministrado será o mesmo? Alguns esclarecimentos precisam ser dados! Por enquanto, a única coisa que está clara é que os alunos, a partir do mês de julho, passaram a ter 20 minutos a menos de aula por dia. E o que temos claro, também, é que o aumento da jornada escolar nas escolas estaduais (sic!) não veio acompanhado das mudanças necessárias na infraestrutura das escolas e nas condições de trabalho dos professores. E isso pode ser comprovado pelas notícias publicadas rotineiramente nos jornais do Estado, comentando a situação de muitas das escolas estaduais (e também municipais). Os alunos, segundo o secretário de Educação terão atividades no contraturno. Mas, em que local? Recentemente, uma das escolas de Guarapari, a EEEFM Leandro Escobar, para atender às crianças no contraturno necessitou utilizar o terraço da casa de uma professora aposentada da escola. Mas foi impedida pela Secretaria de Educação. E, como a escola não tem espaço nem para os alunos do turno, os do contraturno têm atividades em qualquer canto improvisado da escola.

Mais ainda nesta reportagem:

A forma como as 41 horas de aula restantes –necessárias para completar a carga horária anual de mil horas/aula – serão preenchidas ainda não foi definida e ficará a cargo da escola. Para viabilizar a proposta, o aluno também terá que estar disponível no contraturno ou nos finais de semana para completar a sua frequência escolar.

Mas, como afirmou o secretário de Educação na reportagem sobre o mesmo tema no dia 15 de julho (Na volta às aulas, alunos da rede pública sairão mais cedo) "esta é uma oportunidade de liberar a criatividade das crianças e adolescentes e de valorizar o professor" (THOMPSON,2011, p. 10).

Provavelmente, as atividades de contraturno se passem como na escola com Ideb mais baixo de Goiânia, onde os alunos no 4º ano mal sabem ler e que, ao ser visitada pela equipe do JN no Ar – Blitz da Educação, a Diretora afirmou que os alunos têm três horas diárias de atividades de reforço. O Repórter pediu para ver a aula:

Ela era ministrada em área semicoberta por um tatame e compartilhada pelos alunos com alguns instrumentos musicais. Não havia lousa nem material didático. Perguntei pelo arranjo peculiar e me disseram que metade do tempo da aula era usada para lições de tae kwon do (IOSCHPE, p. 88, 2011).

O Informe Publicitário, publicado no jornal "A Gazeta" de 24 de julho, pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Espírito Santo – SINDIUPES parece confirmar que o aumento da carga horária de aulas não foi acompanhado pelas necessárias condições para o seu bom funcionamento. Eis um trecho:

O Sindiupes defende a hora aula de 50 minutos, pois é o tempo adequado para o aproveitamento máximo dos estudantes (sic!) e profissionais da educação básica. Para o sindicato, a ampliação da jornada do aluno só funcionará se vier agregada a condições de ensino que garantam o planejamento, a valorização e a formação continuada dos profissionais. Além de condições físicas e pedagógicas adequadas. Não podemos, por exemplo, tolerar salas superlotadas, escolas degradadas, carência de material didático e outros, uma realidade constante na educação capixaba.

Para o professor(a), a escola não pode ser depósito de alunos, como quer a Sedu (SINDIUPES, 2011, p. 51).

Ainda na edição de "A Gazeta" do dia 5 de maio, na mesma página que noticiou que os alunos da rede estadual do Espírito Santo passariam a ter 20 minutos a menos de aula por dia, foi noticiado também que a Comissão de Educação do Senado tinha aprovado, no dia 3 de maio, dois projetos de lei com o objetivo de ampliar o tempo dos alunos na escola: o PL 385/2007, que altera o inciso VI do artigo 24 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, aumentando de 75% para 80% a exigência de frequência às aulas; e o PL 388/2007, que altera o inciso I desse mesmo artigo, ampliando de 800 para 960 horas/aula a carga horária mínima anual da educação básica, nos níveis fundamental e médio.

Ambos serão votados, ainda, na Câmara dos Deputados. Se virar lei ainda este ano, o PL 388/2007 entra em vigor em 2013. Já o PL 385, entrará em vigor no próximo ano letivo.

Para justificar a alteração proposta no PL 388/2007, o autor, o então Senador Wilson Matos, arguiu a insuficiência dos conteúdos oferecidos aos alunos, tanto em termos qualitativos, como em termos quantitativos. Segundo ele, "a carga horária proposta poderá viabilizar a qualificação e ampliação dos conteúdos trabalhados em aula, de modo a contribuir de maneira mais eficaz para a construção de competências esperadas dos alunos" (JESUS, 2011).

Portanto, se não fosse a inércia dos nossos legisladores, a "solução" sugerida pelo ministro da Educação já estaria em vigor e estados como o Espírito Santo, não poderiam caminhar na contramão das orientações legais.

Ainda sobre propostas de autoridades da educação, logo após a divulgação dos resultados do Enem, o jornal "A Gazeta" de 23 de setembro trouxe: "Ensino Médio: Alunos serão testados em mais 5 disciplinas". E a notícia:

Os alunos do 3º ano do ensino médio que farão as provas do Programa de Avaliação da Educação Básica do Estado (Paebes) serão avaliados em mais cinco disciplinas em 2012(sic!). Neste ano, além dos testes de Língua Portuguesa e Matemática, os estudantes farão prova de Ciências, com questões de Química, Física e Biologia. No ano que vem, será incluída mais uma prova, a de Ciências Humanas, que terá itens de Geografia e História (FIGUEIREDO, 2011, p. 4).

A reportagem informa, ainda, que os resultados do 3º ano do ensino médio no Paebes de 2010 mostraram que os alunos terminam a educação básica sem saber o mínimo necessário. Em uma escala de 0 a 500, o desempenho deles em Língua Portuguesa foi de 264, e em Matemática, 273, quando as notas ideais seriam maiores que 325. Nenhuma informação sobre como a Secretaria de Educação utilizou os dados do ano passado ou como utilizará os dados deste ano. O secretário de Educação, Klinger Barbosa Alves, apenas afirmou que "já demos um importante passo incluindo a prova de Ciências, que é uma habilidade fundamental no ensino médio". Nada foi dito sobre como os alunos são levados a adquirir essa habilidade. E daí, lembramo-nos de uma entrevista concedida por Otaviano Helene, ex-presidente do Inep e Professor do Instituto de Física da Usp, em entrevista ao Terra Magazine, no dia 22 de julho de 2010, fazendo
críticas aos exames como o Enem, Ideb e Saeb, dizendo que, com eles, se mede problemas que já deviam ter sido solucionados. E continua:

Faz décadas que se está medindo. Faz muito tempo que a gente sabe que esses problemas existem. E tudo o que a gente faz é medi-los? Não tem sentido isso. Nenhum problema vai ser resolvido porque ele foi medido várias vezes. Esse é o grave problema de exames como o Enem (JESUS, 2010).

E conclui:

Os estados e municípios não levam em conta a realidade e continuam não levando. Você sabe quais são os problemas no ensino paulista com todos os detalhes possíveis. Sabe onde falta professor e porque falta. Sabe onde as salas são grandes demais, sabe porque os estudantes se evadem, porque eles vão mal, sabe onde faltam instrumentos de gratuidade ativa. Sabe que o salário do professor é, grosso modo, entre metade e dois terços do salário (JESUS, 2010).

Mas, finalmente, uma boa notícia: foi publicada no jornal "A Gazeta" de 4 de outubro: "Rede Pública. Professor vai fazer mestrado sem pagar". Nela é informado que o ministro da Educação anunciou que os professores da rede pública de ensino terão o direito de fazer mestrado e doutorado de graça:

Segundo o Ministério da Educação (MEC), o regulamento do programa será definido em breve. Os cursos terão o mesmo mecanismo do Fundo de Financiamento aos Estudantes do Ensino Superior (Fies).

Os professores que decidirem fazer o curso e trabalharem nas redes públicas terão a dívida encerrada automaticamente ( REDE... 2011, p. 7).

Bem, esperamos que o regulamento leve em consideração o estudo de prioridades das áreas a serem beneficiadas, tomando por base a realidade de cada estado e município.

ENEM
2011: PERSPECTIVAS PARA O ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

Aproximam-se os dias 23 e 24 de outubro quando será realizado o Exame Nacional do Ensino Médio – Enem 2011. Recordemo-nos de alguns resultados do Enem 2009, comparando-o com os resultados de 2010: em 2009, o Espírito Santo teve uma escola na lista das 100 melhores, enquanto em 2010, não teve nenhuma; em 2009, entre as 100 piores pontuações, 5 eram do Espírito Santo e, entre as 1000 piores, 41 eram do Estado , enquanto em 2010, são 31 escolas entre as 100 piores. Entre as 20 piores, no Enem 2009, o Espírito Santo tinha uma escola; em 2010, tem 5. Esses são apenas alguns dos resultados que o leitor poderá visualizar de forma completa no artigo "Enem: retrato sem retoques da educação nacional", publicado no blog Damarlu Educação (www.damarlueducar.blogspot.com).

E as perspectivas para o novo Exame? Para os alunos da rede estadual de ensino do estado do Espírito Santo, as preocupações são muitas! A manchete do jornal "A Gazeta" do dia 1º de setembro trouxe em letras garrafais: "Por que os alunos do Estado correm risco no Enem?" E trouxe também as respostas:

A) Porque o governo decidiu rever, em cima da hora, o sistema de cursinho público.

B) Porque, após a revisão, houve atraso na contratação das empresas do cursinho.

C) Porque, devido à demora, os alunos da rede só terão 41 dia de aula até a prova.

D) X
Todas as alternativas estão corretas.

E a notícia:

Os 1.250 alunos do 3º ano do ensino médio da rede estadual terão apenas 41dias de aulas – sem direito a folga nos próximos feriados e sábados – para se preparar para o Exame Nacional do Ensino Médio – Enem. (...) A novela começou em março, quando a Sedu decidiu romper o convênio com o Projeto Universidade Para Todos (Pupt) – instituição que preparava alunos de escolas públicas para o vestibular desde 2005. A essa altura, a proposta era iniciar as aulas em maio. "Esse tempo (41 dias) não será suficiente para preparar os alunos. Os professores vão adotar uma metodologia diferente", frisou José Vasconcelos, coordenador de ensino do Pupt, que acabou sendo uma das instituições selecionadas (FIGUEIREDO, 2011, p. 3).

Enquanto as aulas não começavam, os alunos fizeram um cursinho improvisado, ministrado por professores da própria rede, que trabalharam com carga horária estendida. Mas, segundo notícia publicada na mesma página da notícia anterior, os "alunos reclamam de cursinho e temem reprovação". A subsecretária de Educação, Adriana Sperandio, reconheceu que o processo "não foi ideal". "Uma série de impedimentos legais atrasou o início das aulas. Só saberemos o impacto disso diante dos resultados do Enem", disse.

Será que precisamos esperar o resultado do Enem 2011 para sabermos o impacto dessa situação nos resultados? Será a situação socioeconômica dos alunos da rede estadual de ensino mais uma vez a vilã responsável pelos fracassos? Ora, a educação brasileira precisa é de uma gestão competente para que os resultados ruins sejam superados. Se os exames (os muitos exames!) fossem levados a sério, a administração da educação de cada estado, de cada município, de cada escola procuraria estudar as causas das deficiências e dos sucessos, seus e dos outros, procurando implementar novas alternativas para a melhoria do desenvolvimento do processo ensinoaprendizagem, com uma ampla participação dos agentes diretamente envolvidos. A burocracia e a política (ou politicagem) deveriam dar lugar à gestão democrática, um dos princípios constitucionais do ensino (CF, art. 206, VI). Para Ilona Becskeházy, diretora executiva da Fundação Lemman,

Os sistemas de ensino mais eficientes são coerentes; o currículo é exigente, o professor é treinado, há uma cadeia que funciona para a sala de aula funcionar, não para o governo aparecer. A educação virou uma arena, um palco onde as pessoas podem aparecer; temos que mudar isso. O foco deve ser a sala de aula (OKADA, 2010) (o grifo é nosso)

Além disso, as escolhas para a assunção dos cargos são baseadas em critérios técnicos, critérios que levam em consideração a competência do indivíduo para o exercício da função. Competência essa que não pode ser medida apenas pela posse de uma titulação acadêmica, mas pela capacidade de envolvimento com os objetivos do sistema educacional.

Mas, para que a situação atual seja modificada, é necessário que os responsáveis pelas políticas públicas voltem os seus olhares para "os próprios umbigos" e deixem de considerar, como o fez o ministro da Educação, Fernando Haddad, que "mais de dois terços da explicação de qualquer desempenho está fora da escola", afirmando que:

É diferente uma escola em um bairro nobre, com um investimento anual dez vezes superior ao de uma escola pública, em área rural, que atende filhos de lavradores que não tiveram acesso à educação. Situação diferente é a de estabelecimentos com perfis semelhantes em termos de localização, financiamento e alunado, mas rendimento escolar discrepante. Nesses casos, segundo Haddad, o gestor precisa tomar providências para melhorar a escola com fraco desempenho e replicar experiências de sucesso. Quando tem a mesma clientela e desempenho desigual, aí cabe ao gestor público agir. (ENEM... 2011) (o grifo é nosso).

E quando a situação daquelas escolas com pior desempenho vai ser considerada? O Ministério da Educação e os governos dos estados sabem quais são as escolas que precisam de mais investimentos, porque não é o fato da escola estar na zona rural e atender a filhos de lavradores que faz com que os alunos não aprendam. É sim, a falta do direcionamento das políticas públicas para essas escolas e para essa clientela, apesar dos números do Enem 2010 indicarem que não são só as escolas públicas da zona rural que apresentam desempenhos sofríveis. São as escolas públicas estaduais de modo geral, que apresentaram maus resultados: no Espírito Santo, foram 92% delas e, no Brasil, 96%.


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